sexta-feira, 15 de junho de 2012

O Mistério do Jorge (não aconselhado a pessoas sensíveis)


      
É fantástico a quantidade de mistérios que existem, por desvendar, nos nossos jardins.
Desta vez foi o Jorge que trouxe um "arni" (animal rastejante não identificado) para a sala de aula. Media, aproximadamente, 3 milímetros e tanto se assemelhava a uma pequena lesma como a uma lagarta na fase inicial do seu desenvolvimento. Era branco e tinha uma risca avermelhada que atravessava o seu corpo, longitudinalmente. 
Fiquei de tentar averiguar o que seria e... foi fácil!
Depois de uma breve pesquisa na internet descobri que se tratava de um Dactylopius coccus, mais conhecido por cochonilha. Dentro da classe dos insetos, as cochonilhas são classificadas na ordem Hemiptera (são conhecidas mais de 67.500 espécies desta ordem), sendo parentes próximas das cigarras e dos pulgões. Medem entre 2 a 5 milímetros e a sua coloração pode ser branca, bege, avermelhada ou esverdeada.

A morfologia de fêmeas e machos é absolutamente distinta. As fêmeas não têm asas, nem pernas, sendo que, por isso, vivem permanentemente no mesmo local. Possuem aparelho bucal sugador que lhes permite sugar os nutrientes de que se alimenta das plantas hospedeiras. O seu corpo é coberto por uma substância cerosa. Os machos têm asas e parecem pequenos mosquitos. Multiplicam-se rápida, e abundantemente, por meio de ovos que originam larvas e, posteriormente, novas cochonilhas. O seu predador natural é a joaninha.
Apesar da sua pequena estatura, estes insetos podem fazer grandes estragos nos jardins e nas produções de frutos cítricos ( plantas que apreciam muito, além dos catos). Sendo sugadores de seiva, retiram nutrientes essenciais das plantas. Para além disto, a cera que segregam diminui a capacidade fotossintética das plantas e ainda facilita o ataque de fungos. Podem constituir verdadeiras pragas, o que lhes rende muitas inimizades.
E pronto, mais um mistério resolvido... ou talvez não...
Algumas considerações secundárias que me foram surgindo, enquanto obtinha mais informação sobre estes seres vivos, deixaram-me  intrigada e assim... resolvi aprofundar a minha pesquisa.
Com o que descobri nas consultas que fui fazendo na biblioteca universal, que é a internet, fiquei admirada, estupefacta e até... chocada. Pensei se deveria, ou não, publicar aqui o que tanto me espantou e decidi... que sim. Eu gosto de saber de que é feito, e de onde veio, tudo o que compro e consumo. Acho que isso me torna mais capaz nas minhas escolhas. Mas, de facto, as letrinhas pequeninas das embalagens de alguns produtos, nomeadamente alimentares e cosméticos, nem sempre são legíveis sem lupa. E, quando o são, revelam-se tão estranhas e dúbias que fico a saber quase o mesmo. Acredito que os meus alunos do 5.º G. que durante este ano letivo, evoluíram tanto e revelaram uma crescente consciência cívica, também sentem o mesmo. Quanto mais não seja, por serem tão positivamente curiosos e quererem saber sempre um pouco mais do mundo que os rodeia.
Assim, se ainda me estás a ler e tens um estômago sensível, o melhor é passares diretamente para a página "Borboletário" ou "Papilio machaon", onde encontrarás imagens lindíssimas e informação fascinante. Até breve!!!
...
E tu? Continuas aí?! Boa, então vamos lá... e prometo não te esconder nada!
A cochonilha é conhecida desde as civilizações Asteca e Maia, populações que viviam antigamente no atual México. Estes povos apreciavam cores fortes e vibrantes e o seu vestuário traduzia isso mesmo.
Povo Asteca
Povo Maia
Imagens de Phillip Martin
Ora, naquele tempo não existiam tinturarias, logo, onde iriam buscar os tintos que utilizavam? É fácil! Tudo o que necessitavam era retirado da natureza e assim usavam plantas, flores e... cochonilhas.
De facto, quando se sentem ameaçadas, as fêmeas desta espécie produzem ácido carmínico, substância com uma acentuada tonalidade vermelha / carmim. Este pigmento também pode ser encontrado nos ovos da mesma espécie. Os astecas, e os maias, esmagavam estes pequenos insetos e obtinham um corante que utilizavam para conferir a cor vermelho escuro ao seu vestuário e às suas pinturas.
             
Mas isso era antes e agora... pois... agora... é quase a mesma coisa!
Os tempos, bem como a história das civilizações antigas, foram evoluindo e as utilizações do corante cochonilha também. Passou a ser utilizado na cosmética e na alimentação humana, para conferir aos alimentos o tom vermelho, tão apelativo para os consumidores.

Durante o período colonial mexicano, em que a Espanha regia este país, a produção de corante cochonilha cresceu rapidamente, tornando-se o segundo produto mais exportado pelo México, superado apenas pela prata. O corante era utilizado em larga escala na Europa e o seu valor era tão alto no mercado industrial que o seu preço chegou a ser negociado na Bolsa de Mercadorias de Londres e Amesterdão.    
Após a Guerra da Independência do México, entre 1810 e 1821, o monopólio da produção de cochonilha chegou ao fim. Produções em larga escala começaram a ser feitas noutros locais. A demanda por cochonilha diminuiu ainda mais com o aparecimento dos corantes sintéticos. Isto representou um grande choque para a Espanha, que além de perder a sua maior colónia na América, viu diversas fábricas produtoras de corante cochonilha falirem por não conseguirem competir com o seu processo praticamente artesanal.
Devido à forte concorrência dos produtos industrializados, a produção deste corante praticamente parou durante o século XX e foi mantida apenas com o propósito de manter a tradição indígena mexicana.
Parecia o fim do corante cochonilha, mas, novas descobertas voltaram a alterar o rumo dos acontecimentos. Os corantes sintéticos, agora amplamente utilizados, foram alvo de estudos científicos que concluíram que poderiam ser tóxicos ou cancerígenos e assim... voltou-se ao velhinho corante cochonilha, ainda que não com a mesma pacificidade.
O corante cochonilha é utilizado, na alimentação humana, para colorir produtos tão diversos como geleias, chãs, doces, bebidas, sorvetes, sumos, presuntos, mortadelas, salsichas e produtos lácteos.
É tão eficaz que apenas 10 gramas de corante conseguem colorir 100 quilogramas de produto, mas, também é facto que para obter uns míseros 450 gramas de corante é necessário matar e esmagar, aproximadamente, 70.000 cochonilhas.
Atualmente as pessoas são mais informadas e conscientes dos seus direitos e deveres e a exploração deste animais levanta muitas questões.
Primeiro, relativamente aos seus riscos para a saúde. O Grupo de Apoio às Crianças Hiperativas (Hyperactive Children's Support Group) recomenda eliminar os produtos que contêm esse corante da dieta das crianças com tal problema, por existirem fortes indícios de que potenciam as dificuldades e alterações observadas. Também é apontado como causa de alergias diversas e perturbações digestivas na população em geral.
Depois das questões de saúde existem muitas questões éticas. Organizações de defesa dos direitos dos animais (sim, é muito pequenino mas também é uma animal que merece ser defendido) e pessoas adeptas do vegetarianismo criticam a prática de obtenção do corante a partir do inseto cochonilha. Tais grupos alegam que é antiético, cruel e fútil o fato de matar milhões de animais para tal finalidade. São muito frequentes as campanhas para divulgar o processo de fabricação do corante carmim e promover o boicote aos produtos que o contêm. E além do mais, é um facto que existem muitos corantes naturais vegetais, e muito mais éticos, feitos com extratos de plantas como beterraba ou paprica. Porque não utilizar estas alternativas?
Para terminar a argumentação, eu também não quero comer CORPOS DE INSETOS ESMAGADOS! Isso é NOJENTO !!!
Agora que já sabes do que se trata, podes fazer escolhas mais conscientes e decidir o que, de facto, queres valorizar. Assim, se não desejas pactuar com este negócio e/ou se não queres continuar a comer insetos esmagados, deves ler atentamente os rótulos dos produtos com cores avermelhadas. Uma coisa é certa: nenhuma empresa vai escrever, preto no branco, o que coloca nos produtos que vende se houver a mínima possibilidade de que isso faça os clientes rejeitarem esse mesmo produto. Por este motivo, disfarçam o nome deste "ingrediente" com outros sinónimos. Tens de estar com muita atenção e excluir os produtos que apresentem as seguintes denominações: "Vermelho 4", "Vermelho 3", "Carmim", "Cochineal", "Corante natural ", "Corante natural carmim de Cochonilha", "Corante C.I" e "Corante ou Colorizante E120" .
            Só depende de ti!!!
Professora Beatriz Alves

6 comentários:

  1. Se isto for mesmo verdade, nunca mais como um iogurte de morango.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Olá Pedro...
      Infelizmente, é mesmo verdade!
      Sabes, não são todos os iogurtes de morango... mas também não são só os iogurtes de morango...
      Confuso?
      Então, há mais produtos para além de alguns iogurtes de morango onde são utilizados estes "corantes naturais", como geleias, gelatinas ou gelados, entre outros. Por outro lado, há marcas que não usam estes aditivos. Pelo sim, pelo não, habituem-se a ler os rótulos...

      Eliminar
  2. As pessoas não deviam matar bichinhos inocentes para produtos cosméticos e alimentares...
    Além do mais, porque podem estar a pôr em risco a saúde humana!
    Obrigada, professora Beatriz, pelo alerta sobre os perigos da aparência apetitosa de alguns produtos e da publicidade enganosa..

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Olá Ana...
      Não tens nada que agradecer! Fico muito feliz por ver que estão interessados e curiosos sobre o mundo que vos rodeia.
      E sabes o que é mesmo muito bom?
      É descobrir que, mesmo de férias, continuam a vir ao blogue ver as novidades e deixar comentários...
      Ainda mexemos!!!

      Eliminar
  3. É bom ver que o nosso blogue continua a evoluir...

    ResponderEliminar
  4. Já estamos de férias mas eu não deixo de visitar o blogue e mesmo assim, de cada vez que o visito, consegue estar ainda mais bonito...

    ResponderEliminar